Por Robson Oliveira
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Era óbvio que os ataques à visita do Papa ao Brasil aconteceriam, só não imaginava que eles começariam tão cedo. A histeria anti-católica por ocasião da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que acontecerá em 2013 no Rio de Janeiro, teve sua primeira epifania recentemente. Sexta-feira, 09/12, um telejornal divulgou matéria imprecisa sobre a emenda no orçamento do estado, solicitada pela deputada Myrian Rios.
A legisladora fluminense solicitou mudança no orçamento, sob a tutela e
apoio da assembleia e do executivo da referida unidade federativa. O
pedido sugere que o orçamento do estado do Rio de Janeiro para 2012 redirecione R$ 5 milhões de reais para a visita que o Chefe de Estado do Vaticano, o Papa Bento XVI, fará ao Brasil e ao estado fluminense. Outros veículos de comunicação também repercutiram o tom impreciso do telejornal, que inclusive insinuou que a solicitação da deputada caracterizaria “desvio de verba” e, portanto, seria crime contra a administração pública.
As críticas sobre a participação do governo na JMJ chegaram muito cedo. E também são muito constrangedoras, especialmente para os que levantaram dúvidas sobre a intenção da parlamentar com a respectiva emenda – mas disso falamos adiante. Vamos à argumentação da reportagem:
1. A visita do Papa Bento XVI trará peregrinos que incharão a cidade, trazendo mal-estar à vida cotidiana dos cariocas ;
2. O dinheiro usado para a visita poderia ser revertido em benefícios para a cidade;
3. O estado laico não admite que o governo financie ou colabore com ações de igrejas particulares.
Não é difícil ver que a reportagem quer denegrir o evento católico e tem um caráter ideológico
muito forte, o que já denuncia a fraqueza na argumentação contra a
emenda da deputada. Por exemplo, afirmar que a chegada de peregrinos vai
piorar o trânsito da cidade, que a visita de jovens vai aumentar a sensação de insegurança, que a excessiva estadia de turistas dificultará o atendimento em hospitais e postos de saúde é uma piada! Com ou sem peregrinos visitando o Rio de Janeiro, os serviços básicos de saúde, transporte e segurança já estão no limite do ridículo. Chega a ser uma afronta à inteligência do carioca afirmar que visitantes do mundo todo é que serão responsáveis pelo caos de 2013 que já existe em 2011. Sim, se o milhão e meio de jovens que foram à Madrid em 2011 tomarem as ruas da Cidade Maravilhosa,
como é previsto, os serviços de atendimento à população poderão sofrer
uma piora considerável. Contudo, daí a afirmar que o cidadão carioca
vive num paraíso de serviços ao contribuinte, de qualidade e quantidade
indiscutíveis, paraíso de benefícios que será destruído por viajantes
católicos sem escrúpulos, há uma distância considerável. Além do mais, o
Rock in Rio, a Rio 92, o Carnaval e, futuramente, a Rio + 20 também
trazem um volume enorme de turistas e visitantes à cidade, mas não
existe a mesma repulsa da mídia por estes eventos. Ora, então por que
afirmar que a vinda dos peregrinos em 2013 trará para a cidade um
mal-estar e um desconforto desconhecidos do carioca? Pelo contrário, infelizmente o cidadão fluminense já convive com serviços de saúde, segurança e transporte risíveis. Colocar também isso na conta do Papa é ilógico, se não absolutamente desonesto.
Outra acusação, essa já esperada, é a de que o dinheiro gasto na JMJ
deveria ser revertido para benefícios básicos, de que a população do
Rio de Janeiro está carente. A reportagem dá um tom catastrófico ao
assunto, induzindo o leitor desatento a imaginar alguma falha de caráter
da deputada Myrian Rios. Uma leitura mais cuidadosa
faz ruir essa insinuação. De fato, a deputada pede aos parlamentares a
reorientação da verba do estado para apoiar a organização de um evento
que é mundial, com um Chefe de Estado. Jovens do mundo todo virão ao país e ao estado para essa jornada e esse aporte parece ser necessário para uma boa preparação. Por
isso, a deputada sugeriu a emenda, que é absolutamente legal, e visa
direcionar uma verba que não pode ir para pagamento de médicos, nem de
policiais, nem de guardas de trânsito. Além disso, a última JMJ rendeu aos cofres de Madrid não 5 milhões de reais, mas 354 milhões de euros, algo superior a 1,5 bilhão de reais. Diante dessas cifras, não parece que os 5 milhões solicitados pela deputada deixam de ser “gasto” e passam a ser “investimento”? Neste prisma – e sem contar empregos diretos e indiretos – a JMJ
não é pago pelo contribuinte fluminense. Pelo contrário, ele é
autossustentável e faz girar a economia onde acontece o evento. Ademais,
os acusadores da deputada esqueceram-se de um dado: não é só a JMJ que recebe ajuda do governo. Curiosamente, este fim de semana aconteceu o Festival Promessas. Este evento gospel acontece no Rio de Janeiro e promete reunir 200 mil pessoas – bem menos que o milhão de católicos no Halleluya de Fortaleza! Para este evento de entretenimento,
não se tem notícia de que parlamentares protestantes tenham solicitado
dinheiro do governo. Afinal, seria muito estranho solicitar erário
público para cantores e dançarinos. No entanto, sem passar pela Assembleia Legislativa e pela vontade do povo portanto, governo (na pessoa de Sergio Cabral) e prefeitura (na pessoa de Eduardo Paes) do Rio de Janeiro prometem 30 milhões de reais para a Geo Eventos, mesma empresa que organiza o Festival Promessas. Não são 5 milhões, orçados e controlados pelo legislativo e pelo executivo; são 30 milhões, na conta de uma empresa particular. Voltando aos argumentos do articulista do jornal, quem
mesmo está gastando dinheiro sem retorno algum para os cofres do Rio de
Janeiro? Quem trará mais resultados para o cidadão: os 5 milhões que
podem se transformar em 1 bilhão ou os 30 milhões que não se sabe se
geram receita para o estado?
O ponto mais vergonhoso na argumentação da matéria é a contraposição do estado laico com a religião. Quem escreveu a matéria quis vender a ideia de que o estado laico é aquele que não subsidia a religiosidade de seus cidadãos.
Ora, mas uma das funções do estado é subsidiar ações que facilitem a
vida dos seus membros. Negar essa função é renegar um caráter próprio do
estado. Uma visão mais perfeita de laicidade revela que estado laico é o estado que não obriga seus cidadãos a seguir uma religião específica.
O estado laico se contrapõe ao estado religioso, como no Iraque, que
obriga todos os cidadãos a serem muçulmanos, com pena de morte para os
outros (veja este texto aqui).
O estado laico não proíbe que seus cidadãos exerçam sua fé em espaços
públicos. O que a matéria do jornal pretende com sua crítica é um estado laicista, isto é, um
estado que obriga os cidadãos a não terem religião ou a não expressarem
em público, perseguindo os que têm coragem de defender seu credo.
É bom que se diga, porém, que esse tipo de tratamento contra religiosos
vai de encontro às leis do Brasil. Veja o que diz o artigo 5o. da nossa
constituição sobre o assunto:
VI – é inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e
a suas liturgias;
VII – é assegurada, nos termos da
lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e
militares de internação coletiva;
VIII – ninguém será privado de
direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou
política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos
imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.
Não há nada de imoral ou ilegal na emenda da deputada Myrian Rios. Pelo contrário, os que a atacam fazem-no por espírito revanchista e/ou pisoteando a Constituição Federativa do Brasil. Seus argumentos são fracos, contraditórios ou simplesmente inexistentes. Muitas críticas sobre a JMJ ainda virão,
mas que pelo menos analisem melhor seus dados e refaçam toda a cadeia
argumentativa. Tal qual foi apresentada no telejornal citado, fica
difícil acreditar no(a) escritor(a).
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