19 de ago. de 2011

Catequese da JMJ: Jovens “testemunhas de Cristo no mundo”

Madri, Sexta-feira, 19 Agosto 2011:O mundo de hoje, incluindo os países de antiga tradição cristã, tornou-se novamente “terra de missão” e está necessitado urgentemente de uma “nova evangelização”, como já exortava o Beato João Paulo II e, agora ainda com mais força, o papa Bento XVI. Ele mesmo criou um novo Dicastério na Cúria Romana, o Pontifício Conselho para a promoção da Nova Evangelização.

Na América Latina, já estamos trabalhando o tema da nova evangelização há pelo menos 20 anos, desde a Conferência de S.Domingo (1992). A Conferência de Aparecida também teve a mesma preocupação. A 12a. Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos, em 2008, tratou da questão da Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja. Não é a primeira vez que, na história da Igreja, se faz necessária uma nova evangelização.



Vivemos numa mudança de época na história da humanidade e uma nova cultura está sendo formada. Todos nós, de alguma forma, somos agentes dessa nova cultura e, também, sofremos os seus impactos. Uma das suas características é a “autonomia” do mundo, do homem e suas atividades, em relação a Deus e à religião. Outras características são o subjetivismo, o individualismo e a privatização dos valores coletivos, que sempre foram importantes para ordenar e harmonizar o convívio social. Também se pretende que a religião e os valores morais sejam da esfera privada e em nada devam influenciar a esfera pública da convivência.

O papa Bento XVI escreve, na Mensagem para esta Jornada: “Existe uma forte corrente de pensamento laicista, que quer separar Deus da vida das pessoas e da sociedade, projetando a criação de um “paraíso” sem Ele. Mas a experiência ensina que o mundo, sem Deus, se converte num “inferno”, onde prevalece o egoísmo, as divisões nas famílias, o ódio entre as pessoas e os povos, a falta de amor, alegria e esperança. Ao contrário, quando as pessoas e os povos acolhem a presença de Deus, o adoram em verdade e o escutam sua voz, constrói-se certamente a civilização do amor, onde cada um é respeitado na sua dignidade e cresce a comunhão, com os frutos que isso traz” (n. 3).

Que fazer, diante dessa situação? Vamos aceitar, resignados e impotentes, que é assim mesmo e nada pode ser mudado? A Igreja tem a convicção de que a verdade precisa continuar a ser buscada e afirmada. Os desertos do mundo precisam ser semeados com a Palavra de Deus. O mundo não pode ser entregue ao seu não-sentido em si mesmo, nem o homem pode ficar condenado à estreiteza dos seus limites. Deus veio ao encontro do homem para romper os seus limites estreitos e para colocá-lo num horizonte amplo e luminoso de sentido. Muitas pessoas continuam a buscar a Deus e o mundo precisa ser salvo. Por isso, é necessário continuar a anunciar a Boa Nova a todos os povos, segundo o mandato de Jesus aos apóstolos, e continuar a lançar a boa semente. Muita semente cairá em terra boa e produzirá fruto a seu tempo.

Cada batizado se torna um discípulo de Jesus Cristo e tem a alegria de conhecê-lo e de ser iluminado pelo seu Evangelho. Ao mesmo tempo, torna-se um missionário de Jesus Cristo, enviado ao mundo para ser testemunha de seu Evangelho para os outros. “Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que nele nossos povos tenham vida” (Conferência de Aparecida, 2007). O chamado a ser evangelizadores não é vocação apenas para alguns poucos, que partem em missão para terras distantes, mas é chamado e graça de todos os batizados. Cada um no seu estado e na condição em que Deus o chamou na vida. Não se pode viver a fé em Cristo, sem dar testemunho dela. “A fé se fortalece, quando é partilhada” (João Paulo II, Redemptoris Missio 2).

Também os jovens são chamados a ser protagonistas nesta nova época missionária da Igreja. Fico muito feliz, quando vejo iniciativas de “missão jovem”, que vão acontecendo um pouco por toda parte. Em São Paulo aconteceram várias experiências bonitas de missão jovem, em preparação a esta jornada. Cristo os chama para dedicarem sua vida para testemunhar seu amor a todos os homens, sobretudo os outros jovens. O melhor missionário do jovem é um outro jovem.

Evangelizar, significa mostrar Cristo com nossas palavras e nossos atos. Por isso, somos chamados a falar explicitamente e sem medo de nossa fé; sem imposição, mas sem timidez, dando testemunho da ação de Cristo em nossa vida. É claro, nossas palavras devem ir acompanhadas pelo nosso testemunho de vida, nosso comportamento e nossa serenidade, para que nossas ações não desmintam o que dizem nossas palavras. De maneira particular, nossa ação evangelizadora deve ser acompanhada pelo testemunho de retidão e honestidade, pelo respeito e amor por toda pessoa e pela dedicação a todos os que sofrem, os pobres, doentes, excluídos e marginalizados.

Os jovens podem contribuir muito para uma presença cristã mais eficaz no meio do mundo, como fermento de uma nova humanidade, como sal da terra e luz do mundo (cf Mt 5, 13-14). 

Se há desânimo, por parte de muitas pessoas, e também de jovens, é preciso “reaquecer os corações mediante o anúncio das Escrituras e a partilha do pão” (cf Lc 24,32). Não serão simplesmente nossos discursos e argumentos que vão fazer com que as pessoas creiam novamente, mas o reencontro com a Palavra de Deus, com o próprio Cristo, que se revela nas Escrituras, na partilha do pão da caridade e da Eucaristia, na acolhida e escuta fraterna, na solidariedade. Nosso papel é ajudar as pessoas a terem um renovado encontro com Deus. Este é nosso papel de missionários de Cristo.

Caros jovens, vocês são privilegiados por terem a ocasião de viver esta experiência tão bonita da Jornada Mundial da Juventude, no encontro com jovens do mundo inteiro, na partilha da fé e de experiências vividas por jovens de culturas e ambientes tão diversos! Esta é a Igreja de Cristo, da qual fazemos parte. É nossa família. Dela somos herdeiros e chamados a serem continuadores. Deixem que seus corações se aqueçam nestes dias e se motivem para tomar em mãos esta herança, que está passando às suas mãos. Somos herdeiros da fé dos apóstolos e dos mártires, dos grandes santos e testemunhas da multiforme graça de Deus que se manifestou através da vida segundo o Evangelho ao longo de 20 séculos. Somos felizes herdeiros e continuadores da missão dos grandes evangelizadores ao longo dos séculos: de S. Agostinho e S.Tomás, de São João da Cruz e S.Teresa d’Ávila, de S.Inácio de Loyola, do Beato Padre Anchieta, dos Mártires André de Soveral e seus companheiros, no Nordeste do Brasil, de tantos conhecidos e desconhecidos que, antes de nós, honraram sua fé, constituíram lares cristãos,  batizaram seus filhos com alegria e os educaram na mesma fé dos pais...

A Igreja de hoje e de amanhã depende de nós, geração que vive este momento de ruptura epocal e de transição da História; ficará para trás, como coisa de museu e interesse arqueológico, todo o bem de 20 séculos do cristianismo e da Igreja? É o que alguns pretendem e gostariam de ver. Mas no que depende de nós, isso não será assim. A fé em Cristo vai continuar a viver na vida pessoal e comunitária da Igreja, a marcar a vida das pessoas e a permear o convívio social. Ela está baseada na força da Palavra de Deus e, se formos fiéis, Deus fará a sua parte e não falhará.

A Igreja quer ajudar e apoiar os jovens na sua preparação para serem testemunhas do Evangelho no mundo, discípulos e missionários de Cristo. Para isso os convida a cultivarem sua fé em grupos de vida, movimentos, pastorais e organizações juvenis. Estas são como escolas de vida cristã e podem oferecer-lhes muito apoio.

Mas quero indicar também um caminho de formação e vida cristã, que deve durar toda a vida e passar a fazer parte de uma fé que vai amadurecendo. Quando a fé não é alimentada, ela se enfraquece, já não consegue resistir às tentações e ao desânimo e corre o risco de morrer dentro de nós.

-   Por isso, cuidem de alimentar cada dia sua fé na oração pessoal; se for possível, também comunitária.

- Aos domingos, procurem participar da Missa, junto com outros jovens, ou com a comunidade na qual vivem; a Missa dominical alimenta e faz crescer e amadurecer nossa fé e a vida cristã, levando-a a produzir frutos. Na comunidade de fé, procurem envolver-se, não sendo meros “assistentes”, mas participando da vida e das iniciativas da paróquia, das organizações da Igreja, que podem ser muito variadas.

- Procurem ler a Palavra de Deus, sobretudo nos Evangelhos e no Novo Testamento em geral. A Palavra de Deus tem a forca de Deus e nos proporciona uma rica ocasião para um encontro pessoal com Deus. Ao lado disso, não deixem de ler e estudar algo sobre a fé, como o Catecismo da igreja Católica, que é o livro de nossa fé. Antes de ler muitos livros críticos sobre a Igreja, a fé cristã e os cristãos, procuremos conhecer o que é nosso, senão, seremos facilmente influenciados por aqueles que, de fora, criticam e denigrem a Igreja.

- E não deixem de se envolver na prática de boas obras, em favor dos pobres, dos doentes, dos que sofrem, dos outros jovens necessitados de ajuda e de toda causa boa neste mundo 9causas ambientais, sociais, solidárias, culturais...).

- O cristão é um cidadão deste mundo e deve fazer frutificar sua fé para o bem do mundo; nossa fé tem efeito sobre a história vivida. Não podemos concordar com aqueles que desejam ver a fé simplesmente relegada para a vida “espiritual” ou para a vida privada, sem nenhum significado para o convívio social. Devemos nos engajar para que o reino de Deus, anunciado pelo Evangelho, envolva a todos e manifeste seus frutos na convivência entre os homens: na paz, na justiça, no respeito, na dignidade, na solidariedade, na bondade, na beleza, na esperança, na vida plena. “Brilhe vossa luz diante dos homens para que, vendo vossas boas obras, eles glorifiquem o pai que está nos céus” (cf Mt 5,16).

- Não deixem de se inspirar e encantar nos tesouros da vida da Igreja. Muitas vezes, nas escolas e universidades, vocês ouvirão falar apenas das possíveis e lamentáveis falhas dos cristãos e da igreja, ao longo dos séculos: inquisição, queima das bruxas, caso Galileu... (como morreu Galileu: na fogueira ou na forca???). Isso tende a incutir uma idéia negativa da Igreja, quando se deixam de lado o muito de bem realizado pela Igreja e pelos cristãos ao longo dos séculos. Sejamos como o homem sábio do Evangelho, instruído nas coisas do reino de Deus: Do “baú recheado” da história e da vida da Igreja, saibamos tirar constantemente “coisas novas e velhas”: coisas bonitas, preciosas, edificantes!

O papa Bento XVI, na sua Mensagem para esta jornada, faz este mesmo convite também: “Na história da Igreja, os santos e mártires buscaram na cruz gloriosa a força para ser fieis a Deus até à entrega de si mesmos. Na fé, encontraram a forca para vencer as próprias fraquezas e superar toda dificuldade. De fato, como diz o apóstolo S.João, “quem é que vence o mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus?” (1Jo 5,5). A vitória que nasce da fé é a do amor. Quantos cristãos foram e são um testemunho vivo da força da fé que se expressa na caridade! Foram artífices de paz, promotores da justiça, animadores de um mundo mais humano, um mundo segundo Deus; comprometeram-se em diversos âmbitos da vida social, com competência e profissionalismo, contribuindo eficazmente para o bem de todos.

A caridade que brota da fé os levou a dar um testemunho muito concreto, com a palavra e as obras. Cristo não é um bem somente para nós, mas é o bem mais precioso que temos para partilhar com os outros. Na era da globalização, sede testemunhas da esperança cristã no mundo inteiro. São muitos os que desejam receber esta esperança. Diante do túmulo do amigo Lázaro, morto já há 4 dias, Jesus disse a Marta, irmã de Lázaro, antes de chamá-lo novamente à vida: “se creres, verás a glória de Deus!” (Jo 11,40). Também vós, se crerdes, se souberdes viver e dar cada dia o testemunho de vossa fé, sereis um instrumento que ajudará outros jovens, como vós, a encontrar o sentido e a alegria da vida, que nascem do encontro com Cristo (n. 5).

Encerro com a bela oração de S.Inácio de Loyola, um grande convertido e apaixonado por Cristo, que, como Paulo, entregou sua vida e suas energias inteiramente por Cristo e pela Igreja:

“Tomai, senhor, e recebei toda a minha liberdade, a minha memória também, o meu entendimento e toda a minha vontade. Tudo o que tenho e possuo, vós me destes com amor. Todos os dons que me destes, com gratidão vos devolvo; disponde deles, Senhor, segundo a vossa vontade. Dai-me somente o vosso amor, vossa graça. Isto me basta, nada mais quero pedir.”

Catequese de língua portuguesa na Paróquia San Sebastian, em Madri, durante a Jornada Mundial da Juventude, em 19/8
 
Arcebispo de São Paulo

fonte: http://www.arquidiocesedesaopaulo.org.br/?q=pt-br/node/5489

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